Canal Celta

13.4.08

Furius : herói, vilão ou oportunista?

Marcus Furius Camilus
446/365 a.C



screver a respeito de Marcus Furius Camillus envolve uma particular dificuldade não bem pela ausência de fatos ao seu respeito, mas sim quantas interpretações controversas existem sobre suas atitudes e sua real importância por detrás de alguns eventos históricos.

De incontroverso ao meu ver temos que ele era filho de uma família ilustre que na origem remonta aos nobres patrícios fundadores de Roma bem como também foi líder de campanhas militares vitoriosas bastante relevantes.

Memento mori

Por sua vitórias militares teve o direito de cumprir uma solenidade de ´´ Triunfo´´ que era tida em alta conta na sociedade romana, sendo que Furius foi um dos poucos generais romanos ao tempo da República que conquistou não menos que quatro vezes esta honraria ( mais que ele só Júlio César muito tempo depois )

No ´´ Triunfo ´´ o agraciado partia do ´´Campus Martius´´ ( situado fora dos muros da cidade ) entrava em Roma atravessando a ´´ Porta Triumphalis´´ por sobre um tapete de flores que a população jogava aos seus pés enquanto caminhava sem pressa em direção ao Senado para receber os louros da vitória para ornamentar sua cabeça em meio de grande gritaria da plebe .

Conforme rezava a tradição no momento alto da cerimonia de entrega dos louros era dito quase em sussurro para o agraciado os dizeres ´´ Memento mori´´ / ´´Lembre-se dos mortos´´ na intenção de recorda-lo quanto mais dignos ainda eram os mortos no campo de batalha que às custas da própria vida deram seu sangue por Roma.

Destino roubado

Ser cônsul, cargo de grande importância e enorme poder na República romana, parecia ser o destino lógico e necessário para alguém como Marcus Furius Camillus. Até porquê ninguém até então tinha conseguido ao mesmo tempo conquistar a simpatia da Plebe, o apoio dos Patrícios e admiração das tropas tal como fez Furius.

Ocorre que a fama e fortuna de Furius o fez vítima preferencial tanto de inveja quanto fonte de temor que restaurasse a monarquia se fazendo o rei de Roma ou algo assemelhado. Não por menos Plutarco em sua obra Vidas Paralelas observa que :

´´Entre as grandes façanhas que Furius Camilus realizou, há uma muito particular e estranha, que é a de que, sendo general de muitas vitórias importantes, sido cinco vezes ditador, ter quatro triunfos e ser chamado Segundo Fundador de Roma, nem uma vez sequer chegou a ser cônsul. ´´ ( Plutarco - Vidas Paralelas / Volume I )


Quando estaria a caminho do que seria mais um ´´Triunfo´´, resultado da conquista da vizinha cidade etrusca de Veios em 396 a.C , o Senado negou-lhe esta honraria sobre a grave acusação de ter distribuído de modo injusto o butim do saque entre os soldados.

Veja que falamos não de qualquer batalha, mas de um combate que pós fim a dez anos de guerra entre as cidades cuja a rivalidade era sem par. A destruição de Veios, assim, foi um fato significativo para consolidação da influência política, econômica e militar de Roma na região que até então tinha que correr o risco de ter um perigoso inimigo bem perto de seus muros.

Não que a acusação fosse toda injusta, mesmo ousaria dizer que Furius era corrupto sim só que não mais do que qualquer outro seu conterrâneo e na mesma perspectiva tão moralmente leviano quanto qualquer um envolvido na vida política romana da época.

O fato é que Furius não chegou nunca a ser formalmente condenado ou inocentado, mesmo porquê partiu com orgulho ferido em auto-exílio voluntário para cidade de Ardea antes de qualquer acusação ser formalizada perante os Tribunos. De toda maneira isto foi uma pá de cal em suas pretensões em ser um dia cônsul da República romana.

O retorno

Por cerca de seis anos Marcus Furius Camillus manteve um obsequioso silêncio em Ardea, sem participar mais do cenário político romano como personalidade de destaque até que no ano de 390 a.C tudo muda de maneira inesperada.

Eis aqui o momento que a controvérsia se levanta forte, onde dependendo da visão Furius em seu ostracismo auto-imposto retorna em triunfo para salvar Roma da destruição total, mesmo aproveita de uma situação de perene caos instalado pela invasão celta para assumir o controle da cidade das Sete Colinas ou até alegam que ele tenha participação velada no desenrolar dos acontecimentos.

Herói ou vil oportunista fato é que Furius consegue ao final o Triunfo outrora negado com tanta desonra pela conquista da cidade etrusca de Veios, sendo nomeado ditador de Roma e atingindo o status de renome de ´´ Pater Patriae´´ na condição de Segundo Fundador de Roma.

Ao final Furius , aproveitando do cenário de terra-arrasada da cidade, promove uma série de reformas urbanas e arquitetônicas em Roma o que ao mesmo tempo serviu para reanimar o orgulho romano, gerar empregos para muito que tinham perdido tudo na invasão e fortalecer as defesas militares citadinas.

Em termos políticos Furius como Ditador deu apoio a chamada ´´ Leges Liciniae Sextiae´´ proposta por tribunos da plebe Caius Licinus Stolo e Lucius Sextius Sextinus Lateranus onde foi definido entre outras coisas que deveria haver na constituição do consulado um representante da plebe o que fez que por volta do ano de 360 a.C fossem eleitos Marcus Emilus pelos Patrícios e Lucius Sextius pelos Plebeus como representantes do primeiro consulado ´´misto´´ da República romana.

Já um ancião octagenário Marcus Furius Camilus vem a falecer pela peste, um legado tardio deixado em Roma por conta do Dies Nefastus.

ATENÇÃO ! ´ Furius : herói, vilão ou oportunista ?´ é continuação dos textos : ´ Dies Nefastus´ , ´Prelúdio da Batalha de Allia´, ´Os celtas em Roma´ , ´A Invasão´ , ´A Batalha do Monte Capitólio´ , ´´Vae victis ! ´´ e ´ Os fatos e suas versões .´